O Cordel se reinventa entre folhetos, versos e o contar das notícias do dia a dia

Fonte: Iphan | Foto de Francisco Moreira da Costa
Por Sérgio Melo
Como jornalista e entusiasta da cultura nordestina, tenho observado com admiração a vitalidade da Literatura de Cordel em nossos dias. Essa forma poética, enraizada na tradição oral e impressa em folhetos ilustrados por xilogravuras, continua a encantar leitores com histórias que vão do amor à crítica social. Em Campina Grande, Paraíba, é comum encontrar esses folhetos pendurados em cordas, ou “cordéis”, nas feiras e mercados locais, perpetuando uma prática que remonta ao século XIX.
A Literatura de Cordel tem suas raízes em Portugal, mas foi no Brasil, especialmente no Nordeste, que se consolidou como uma das expressões mais autênticas da cultura popular. Os primeiros cordelistas brasileiros, influenciados pelos trovadores portugueses, começaram a escrever versos rimados que narravam histórias do cotidiano, lendas, desafios entre personagens e até eventos políticos. No século XIX e início do século XX, os folhetos passaram a ser impressos e vendidos em feiras livres, tornando-se um meio acessível de informação e entretenimento para a população.
Mas, afinal, o que é a Literatura de Cordel? Trata-se de um gênero literário popular escrito em forma de poesia rimada, muitas vezes acompanhada por ilustrações em xilogravura. Os versos costumam seguir métricas específicas, como sextilhas (estrofes de seis versos) e décimas (estrofes de dez versos), além de manterem uma cadência musical que facilita a leitura em voz alta. O cordel pode abordar temas variados, desde histórias épicas até sátiras políticas e crônicas sociais, sendo um meio de comunicação e resistência cultural.
Os elementos essenciais do cordel vão além do texto rimado. A oralidade desempenha um papel fundamental, pois muitos cordelistas declamam seus versos em feiras e praças, perpetuando a tradição oral do povo nordestino. Além disso, a xilogravura – técnica de gravura em madeira – é um dos símbolos mais marcantes do gênero, dando identidade visual única aos folhetos. Outro aspecto importante é a temática popular, que mantém viva a conexão entre a arte e as experiências do povo, tornando o cordel um reflexo autêntico da cultura e do dia a dia do nordestino.
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Interessante notar que o termo “cordel” não se restringe apenas a essa manifestação literária. Originalmente, “cordel” refere-se a uma corda fina ou barbante, como apontado no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. No contexto literário, passou a designar os folhetos expostos em cordas para venda. Além disso, em nosso cotidiano, a palavra “cordel” é utilizada de forma metafórica para descrever uma sequência de eventos ou notícias interligadas, como quando dizemos: “Hoje, Ayana vai contar um verdadeiro cordel de notícias sobre a Paraíba”. Essa expressão captura a essência narrativa e encadeada que caracteriza tanto os folhetos quanto as histórias do dia a dia.
A riqueza semântica da palavra “cordel” reflete sua importância cultural e sua capacidade de adaptação aos novos tempos. Seja nos tradicionais folhetos vendidos nas feiras de Campina Grande, seja nas expressões populares que permeiam nosso linguajar, o cordel permanece vivo, celebrando a criatividade e a identidade do povo paraibano.