Coco voltado: Coqueiro Alto entre a Paraíba e Pernambuco

Vivência entre Coqueiro Alto e os mestres Felipe Francinha, Emerson e Rodolfo Dik, na sede da Capoeira Lua de São Jorge (Cidade Tabajara, Olinda/PE, em 07 de setembro de 2024)

Coco voltado: Coqueiro Alto entre a Paraíba e Pernambuco

Escrito por: Herbert de Andrade Oliveira (professor e historiador), Williams Lima Cabral (historiador e músico)

 

O grupo percussivo Coqueiro Alto vem, ao longo da última década, mantendo e popularizando um dos estilos mais tradicionais de música e dança do Nordeste brasileiro: o “Coco de Roda”, ou simplesmente Coco. Sua fundação foi fruto da confluência de músicos que já tinham familiaridade e interesse de trabalhar e pesquisar essa expressão cultural: tudo começou com debates e ensaios, até que começaram a aparecer os convites para participação em festas e festivais. Surgido inicialmente sem muita pretensão, na cidade de Campina Grande, Paraíba, no ano de 2015, o Coqueiro Alto acabou por se consolidar como um verdadeiro bastião de defesa da nossa cultural regional. A missão do grupo sempre foi a de resgatar a cultura “coquista”, incentivando a prática percussiva e a formação de plateia, a fim de fortalecer e difundir este importante elemento da Cultura Popular.

Sobre o Coco, ou melhor, os Cocos no plural, podemos fazer uma divisão bastante genérica entre aqueles que são apenas cantados, como os de Embolada, e aqueles que unem canto e dança, como os Cocos de Roda. Esses últimos, portanto, não podem ser caracterizados e apreciados apenas pelo seu horizonte musical, pois deles fazem parte muitos outros elementos artísticos (como a própria dança), estéticos, comportamentais e imagéticos.

 

A ironia e o grotesco tal qual se desenvolvem nos cocos de embolada apenas cantados ao acompanhamento de pandeiro não são caracterizadores dos cocos cantados durante a dança. Na brincadeira do coco há ironia, há ambiguidade, há momentos de crítica social, mas a construção dos versos e o sentido da poesia é diferente. A poesia, neste caso, configura-se como um dentre vários elementos indispensáveis para o canto e a dança. Nos cocos dançados predomina o coletivo: para que haja a dança é preciso gente para (a)tirar os cocos e para responder dentro da roda de dançadores, gente que toque os instrumentos, gente que saiba os passos que caracterizam a dança e esteja disposta a entrar na roda.

Extraído do livro COCOS – ALEGRIA E DEVOÇÃO, organização de Maria Ignez Novais Ayala e Marcos Ayala, Crato/CE: Editora Edson Soares Martins

 

Dentro desse universo de possibilidades, e tratando especificamente da poética e da métrica, uma variante particularmente interessante é o “Coco Voltado”, comum no estado de Pernambuco. Se baseia em um refrão cuja rima é alcançada por meio de um jogo de palavras e versos que se repetem, sem, contudo, se tornar monótono. No Coco Voltado a frase inicial é a mesma que encerra o refrão e, fazendo jus ao nome do estilo, o final de cada verso se repete no início do seguinte, numa verdadeira “ida e volta” de palavras. Vemos figuras de linguagem sendo usadas para aperfeiçoar a sonoridade dos versos, garantindo o ritmo da música e estimulando os corpos dos dançantes.

 

Momento da vivência dedicada à dança(Cidade Tabajara, Olinda/PE, em 07 de setembro de 2024)
Momento da vivência dedicada à dança
(Cidade Tabajara, Olinda/PE, em 07 de setembro de 2024)

Se a criatividade é um dos elementos essenciais para a produção artística, a nova música “Bombo da Paraíba”, cujo refrão pode ser apreciado no áudio compartilhado ao final deste texto, é um exemplo bem-sucedido de intercâmbio criativo entre coquistas da Paraíba e mestres da cultura popular de Pernambuco. O refrão formado pelo verso de ida “Meu bombo tocou em Olinda” e de volta “Em Olinda meu bombo tocou”, é representativo da história dos cocos nordestinos e também do próprio grupo Coqueiro Alto. Foi entre idas e vindas de Pernambuco à Paraíba, no decorrer de séculos, que pessoas e elementos da cultura material e imaterial fluíram, se influenciando mutuamente e formando as bases da cultura dessa região. Foi entre idas e vindas da Paraíba à Pernambuco, na última década, que o grupo Coqueiro Alto se fortaleceu, criou raízes e formou uma verdadeira família musical.

“Bombo da Paraíba” foi criada, ensaiada e gravada durante um projeto de circulação cultural executado no mês de setembro de 2024, patrocinado pelo Edital Arte na Bagagem de apoio à circulação artística, iniciativa do Governo da Paraíba através da Secretaria de Cultura. A criação e gravação da música eternizou nosso projeto e, acima de tudo, se tornou mais um capítulo da frutífera história de intercâmbio entre os estados geograficamente vizinhos e culturalmente irmãos.

 

Detalhe da gravação em estúdio da música “Bombo da Paraíba”(Cidade Tabajara, Olinda/PE, em 08 de setembro de 2024)
Detalhe da gravação em estúdio da música “Bombo da Paraíba”
(Cidade Tabajara, Olinda/PE, em 08 de setembro de 2024)

As fotografias que ilustram o texto são pequenos registros dessa vivência entre os integrantes do Coqueiro Alto e os músicos pernambucanos da Cidade Tabajara em Olinda. Tal vivência certamente contribuiu com a construção da identidade do Coqueiro Alto e acrescentou muito para o conhecimento e a experiência pessoal de cada um dos envolvidos.

Rompendo com as fronteiras tradicionalmente estabelecidas entre os dois estados da federação, geográfica ou culturalmente falando, esse projeto de intercâmbio se constituiu em um verdadeiro movimento de construção, não só de uma dita cultura regional ou local, mas da própria cultural e arte nacional.

 

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